Novembro a chegar com um bom livro
Chegou novembro, já com algum frio e com muita chuva, pelo menos cá pelos "Algarves".
São ótimos os conselhos da Cláudia Matos no que respeita à leitura. Na minha Ideia a leitura não só nos enriquece como nos aquece...o pensamento.
Para este mês a Cláudia fala-nos de um livro de Mia Couto. Só por isso deve ser bom, mesmo muito bom, vamos ver.
A saia almarrotada, selecionado da obra O fio das missangas, de Mia Couto
Conto que narra a trajetória de opressão e os mecanismos usados pela personagem principal na sua tentativa de libertação.
Assiste-se a uma situação de clausura voluntária, pois a realidade circundante levou a que a sua existência se justificasse apenas para cuidar dos mais velhos.
“Na minha vila, a única vila do mundo, as mulheres sonhavam com vestidos novos para saírem. Para serem abraçadas pela felicidade. A mim quando me deram saia de rodar, eu me tranquei em casa. Mais que fechada, me apurei invisível, eternamente noturna.”
Deparamo-nos com um narrador na 1ª pessoa que é também personagem principal.
A personagem não tem um nome que lhe confira individualidade e a pertença à sociedade.
Assinala também, a sua exclusão em relação ao seu grupo social. Parece que a única saída naquela cultura seria nascer de novo: “Mais que o dia seguinte, eu esperava pela vida seguinte.”
Trata-se de um conto muito interessante do ponto de vista literário, pois contém bastante simbologia.
O título A saia almarrotada, cuja última palavra é um neologismo que reúne as noções de amarrotada e de alma rota, evidenciando o estado de ceticismo que marca a personagem.
A solução para o seu problema encontra-se, também, na espera por um homem que a libertaria. Isto é revelador da frágil condição da mulher condicionada à figura masculina.
A narrativa atinge o seu ápice quando recebe do seu tio um vestido oferecido em segredo. Quando o pai descobre e ordena que o queime, ela prefere jogar fogo sobre si mesma a destruir o que ele representa. Não pode destruir o sonho, a esperança, uma vez que o vestido invoca tudo aquilo que ainda não foi vivido.
Também se verifica uma analogia entre a protagonista e a situação de Moçambique no período colonial. No caso da mulher africana, ela acaba por ser duplamente oprimida, pelo colonizador e pelo homem africano.
Mia Couto é um escritor moçambicano, cujas obras poderá encontrar numa biblioteca bem perto de si…
Cláudia Matos